Quinta-feira, 26 de Agosto de 2004
"O Bebé Âncora
Era uma vez uma linda menina
que vinha do mar.
E só havia um sítio
onde queria estar.
Com um tipo andarilho
que tocava numa banda.
Deixaria o oceano
para cumprir sua demanda.
Ele era para ela
o mais desejado.
E tentou de tudo
para o ter a seu lado.
Mas a vida dela
com a dele andou desfazada.
Deambulou pela terra
sozinha e abandonada.
Tentou parecer feliz,
tentou parecer trágica,
tentou cartas astrais,
sexo e varinha mágica.
Nada os podia unir,
excepto talvez... uma réstia de esperança:
uma coisa que lhes ancorasse os espíritos...
Tiveram uma criança.
Mas precisaram de uma grua
para o parto do novo ente.
O cordão umbilical
era em forma de corrente.
Era feio e sombrio
e muitíssimo pesado.
Não tinha pele cor de rosa:
só ferro enferrujado.
O bebé que nascera
para cimentar aquele amor
encheu-os a ambos
de um terrível mau humor.
Por isso, para a sua banda
regressou o andarilho,
jurando que nunca mais
se metia em tal sarilho.
E ela ficou sozinha,
com o bebé para cuidar:
tornou-se tão opressivo
que acabou por a afundar.
No fundo do mar,
depôs o seu amor.
Só restava ela, o bebé
e uns peixes em redor."
Tim Burton, Morte Melancólica do Rapaz Ostra e Outras Histórias, 1997